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Na segunda metade do século XIX, algumas obediências maçónicas europeias, lideradas pelos jacobinos franceses, renegaram as Constituições (de que pretendiam fazer uma "interpretação livre" e "moderna") e os Landmarks (que consideraram "obsoletos"). Pequenas "bolsas" de "maçons liberais" constituíram-se então em França, Itália, Bélgica, auto-excluindo-se da Regularidade, passando a combater a Igreja Católica em particular e a religiosidade em geral, aliando-se às pugnas profanas da política partidária e às campanhas mais extremas, pegando em armas e afastando-se de tudo o que é o ensinamento maçónico.
Não obstante, a grande maioria das Lojas manteve-se na Regularidade, mesmo nos países onde simultaneamente brotava aquilo que os historiadores maçónicos designaram por "Maçonaria Latina". Ao longo de todo o século XIX, pelo seu lado, a Maçonaria Regular radicou-se solidamente na generalidade da Europa e ramificou-se no Continente Americano. Aí, uma vasta rede de Lojas e de obreiros atravessa a quadrícula dos Estados Unidos, do Canadá, do Brasil e da totalidade da América hispânica, nisto se contando metade do total mundial dos obreiros maçons. E até na mais remota destas Lojas se trabalha sempre "à glória do Grande Arquitecto do Universo", com o volume da Lei Sagrada aberto e os corações voltados para o Alto.
Este carácter espiritual da Maçonaria encontra-se, pois, inteiramente preservado: mais de noventa por cento dos homens que se intitulam maçons são, de facto, reconhecidos pelos seus irmãos. A questão do "reconhecimento" é de importância capital para os maçons. Nos seus rituais, à pergunta "És maçon?" respondem, invariavelmente: "Os meus irmãos reconhecem-me como tal". Sem o reconhecimento dos irmãos, sem a ligação ao vínculo tradicional, sem a transmissão "regular" da palavra de mestre a discípulo, a Maçonaria desligar-se-ia da sua essência. Esta classe de requisito é, aliás, comum à generalidade das ordens que buscam o aperfeiçoamento espiritual.
Fraternidade de natureza iniciática e escola de conhecimento simbólico, a Maçonaria visa o aperfeiçoamento do homem (que assim se assume como pedreiro da sua própria edificação interior). Usa a simbologia iniciática dos mestres construtores dos templos medievais como meio de transmitir conhecimentos, reflexões e divisas. Tem, por natureza constitutiva, um compromisso de aspiração à harmonia divina.
Hoje, no nosso país, uma só potência é reconhecida pela Maçonaria Regular: a Grande Loja Legal de Portugal / Grande Loja Regular de Portugal (GLLP/GLRP), criada em Lisboa em 1990. O Grande Oriente Lusitano (GOL) não se encontra reconhecido como potência maçónica "regular", filiando-se historicamente na corrente jacobina que no século XIX dissidiu da loja-mãe e dos Landmarks.
A confusão entre o Grande Oriente Lusitano e "a Maçonaria", em geral, advém do facto de, durante mais de cem anos, não ter operado em Portugal qualquer Ordem Maçónica reconhecida pela Regularidade. Durante esse enorme lapso, o Grande Oriente foi a única organização portuguesa a reclamar-se dos valores éticos da Maçonaria - praticando, apesar da sua "irregularidade", rituais semelhantes ou iguais aos dos maçons regulares, embora sem a obrigatoriedade de aceitação de um princípio ordenador do caos e dispensando-se o uso do livro da Lei Sagrada.
Em 1985, um grupo de membros do Grande Oriente Lusitano declarou uma dissidência, propugnando um regresso à Regularidade maçónica e à via espiritual. Não a obtendo no interior, abandonou o GOL e, sob o patrocínio inicial da Grande Loja Nacional de França, logo secundado pela Grande Loja Unida de Inglaterra, constituiu uma primeira Loja regular em território português, que em 1990 deu origem à Grande Loja Regular - a primeira potência maçónica portuguesa a ser universalmente reconhecida desde meados do século XIX.
Autor anónimo